"Não penseis que vim destruir a lei ou os profetas; não vim para destruí-los, mas para dar-lhes cumprimento. Porque em verdade vos digo que o céu e a Terra não passarão, até que não se cumpra tudo quanto está na lei, até o último jota e o último ponto." (Mateus 5:17- 18)
O Espiritismo é a nova ciência que vem revelar aos homens, por meio de provas irrecusáveis, a existência e a natureza do mundo espiritual e suas relações com o mundo material.
Ele nos mostra esse mundo, não mais como sobrenatural, mas, pelo contrário, como uma das forças vivas e incessantemente atuantes da natureza, como a fonte de uma infinidade de fenômenos até então incompreendidos, e por essa razão rejeitados para o domínio do fantástico e do maravilhoso.
É a essas relações que o Cristo se refere em muitas circunstâncias, e é por isso que muitas coisas que ele disse ficaram ininteligíveis ou foram falsamente interpretadas. O Espiritismo é a chave que nos ajuda a tudo explicar com facilidade.
A lei do Antigo Testamento está personificada em Moisés, a do Novo Testamento, no Cristo. O Espiritismo é a terceira revelação da lei de Deus. Mas não está personificado em ninguém, porque ele é o produto do ensinamento dado, não por um homem, mas pelos Espíritos, que são as vozes do céu, em todas as partes da Terra e por inumerável multidão de intermediários.
Trata-se, de qualquer maneira, de uns seres coletivos, compreendendo o conjunto dos seres do mundo espiritual, cada qual trazendo aos homens o tributo de suas luzes, para fazê-los conhecer esse mundo e a sorte que nele os espera.
Da mesma maneira que disse o Cristo: “Eu não venho destruir a lei, mas dar-lhe cumprimento”. Também diz o Espiritismo: “Eu não venho destruir a lei cristã, mas dar-lhe cumprimento”.
Ele nada ensina contrário ao ensinamento do Cristo, mas o desenvolve, completa e explica, em termos claros para todos, o que foi dito sob forma alegórica. Ele vem cumprir, na época predita, o que o Cristo anunciou, e preparar o cumprimento das coisas futuras.
Ele é, portanto, obra do Cristo, que o preside, assim como preside ao que igualmente anunciou: a regeneração que se opera e que prepara o Reino de Deus sobre a Terra.1
Jamais o Espiritismo pretendeu trazer aos homens outra moral senão a do Cristo, e que não se dirige aos que a PRATICAM na sua pureza. Mas, como há muitos que não creem nem em Deus nem na alma ou nos ensinamentos do Cristo, ou, pelo menos, duvidam, e cuja moral se resume no cada um por si, provando a existência da alma e da vida futura, o Espiritismo vem dar uma sanção prática e uma necessidade a essa moral.2
Ensinos e dissertações dos Espíritos
O Espiritismo Filosófico
Meus amigos, falamos do Espiritismo do ponto de vista religioso; agora que está bem estabelecido que ele não é uma religião nova, mas a consagração dessa religião universal cujas bases lançou o Cristo, e que hoje vem levar ao coroamento, vamos encarar o Espiritismo do ponto de vista moral e filosófico.
Antes de mais, expliquemo-nos quanto ao exato sentido da palavra filosofia. A filosofia não é uma negação das leis estabelecidas pela divindade, da religião. Longe disto, a filosofia é a busca do que é sábio, do que é o mais exatamente razoável. E o que pode ser mais sábio, mais razoável que o amor e o reconhecimento que se deve ao seu Criador e, conseguintemente, o culto, seja qual for, que pode servir para lhe provar esse reconhecimento e esse amor? A religião, e tudo quanto a ela vos pode levar é, pois, uma filosofia, porque é uma sabedoria do homem que a ela se submete com alegria e docilidade. Feitos esses reparos, vejamos o que podeis tirar do Espiritismo, posto em prática seriamente.
Qual o fim para onde tendem todos os homens, seja qual for a posição em que se encontrem? O melhoramento de sua posição presente. Ora, para o conseguir, correm para todos os lados e se extraviam na maior parte, porque, enceguecidos pelo orgulho, arrastados pela ambição, não veem a única rota que pode conduzir a esse melhoramento; buscam-na na satisfação do orgulho, de seus instintos brutais, de sua ambição, ao passo que só poderão encontrá-la no amor e na submissão devidos ao Criador.
O Espiritismo vem, pois, dizer aos homens: Deixai esses atalhos tenebrosos, cheios de precipícios, cercados de espinhos e urzes e entrai no caminho que leva à felicidade que sonhais. Sede prudentes, a fim de serdes felizes; compreendei, meus amigos, que para os homens os bens da Terra não passam de emboscadas, que devem evitar. Eis por que finalmente o Senhor permitiu vísseis a luz desse farol, que deve vos conduzir ao porto.
As dores e os males que sofreis com impaciência e revolta são o ferro em brasa que o cirurgião aplica sobre a ferida aberta, a fim de impedir a gangrena de perder todo o corpo. Vosso corpo, meus amigos, o que representa para o Espírito? que deve ele salvar? que deve preservar do contágio? que deve cicatrizar, por todos os meios possíveis, senão a chaga que rói o Espírito, a enfermidade que o entrava e o impede de lançar-se radioso para o seu Criador?
Voltai sempre os olhos para este pensamento filosófico, isto é, cheio de sabedoria: Somos uma essência criada pura, mas decaída; pertencemos a uma pátria onde tudo é pureza; culpados, fomos exilados por algum tempo, mas só por algum tempo. Empreguemos, pois, todas as nossas forças, todas as energias em diminuir o tempo de exílio; esforcemo-nos por todos os meios que o Senhor pôs à nossa disposição para reconquistar essa pátria perdida e abreviar o tempo de ausência. (Vide o número de janeiro de 1862: Doutrina dos anjos decaídos.)
Compreendei bem que vossa sorte futura está em vossas mãos; que a duração de vossas provas depende inteiramente de vós; que o mártir tem sempre direito à palma da vitória e que, para ser mártir, não é necessário, como aconteceu com os primeiros cristãos, servir de pasto aos animais ferozes. Sede mártires de vós mesmos; quebrai, aniquilai em vós todos os instintos carnais que se revoltam contra o Espírito; estudai com cuidado as vossas inclinações, os vossos gostos, as vossas ideias; desconfiai de tudo quanto a vossa consciência reprova.
Por mais baixo que ela vos fale, porque muitas vezes pode ser repelida; por mais baixo que ela vos fale, essa voz do vosso protetor vos dirá que eviteis o que vos pode prejudicar. Em todos os tempos a voz do vosso anjo-da-guarda vos falou, mas quantos ficaram surdos! Hoje, meus amigos, o Espiritismo vem explicar-vos a causa dessa voz íntima; vem dizer positivamente, vem vos mostrar, fazer tocar com o dedo aquilo que podeis esperar se a escutardes docilmente; aquilo que deveis temer se a rejeitardes.
Eis, meus amigos, para o homem em geral, o lado filosófico: a vós compete salvar-vos a vós mesmos. Meus filhos: não procureis distrações materiais nem satisfação à curiosidade, como fazem os ignorantes. Não chameis a vós, sob o menor pretexto, Espíritos dos quais não tendes a mínima necessidade; contentai-vos em vos entregardes sempre aos cuidados e ao amor de vossos guias espirituais; eles jamais vos faltarão.
Quando vos reunirdes num objetivo comum, qual seja o melhoramento de vossa Humanidade, elevai o coração ao Senhor, mesmo que seja para lhe pedir suas bênçãos e a assistência dos Espíritos bons, aos quais vos confiou. Examinai bem em vosso redor se não há falsos irmãos, curiosos, incrédulos. Se os encontrardes, rogai-lhes com doçura, com caridade, que se retirem. Se resistirem, contentai-vos em orar com fervor para que o Senhor os esclareça e, de outra vez, não os admitais em vossos trabalhos.
Não recebais em vosso meio senão os homens simples, que querem buscar a verdade e o progresso. Quando estiverdes certos de que vossos irmãos se acham reunidos em presença do Senhor, chamai os vossos guias e pedi-lhes instruções; eles vo-las darão sempre, proporcionadas às vossas necessidades, à vossa inteligência; mas não busqueis satisfazer a curiosidade da maioria dos que pedem evocações. Quase sempre saem menos convencidos e mais dispostos à zombaria.
Aqueles que desejam evocar seus parentes e amigos não o façam jamais senão com um objetivo de utilidade e de caridade; é um ato sério, muito sério, chamar os Espíritos que erram em redor de vós. Se não trouxerdes a fé e o recolhimento necessários, os Espíritos maus tomarão o lugar daqueles que esperais, enganar-vos-ão e vos farão cair em erros profundos e algumas vezes vos arrastarão em quedas terríveis!
Não esqueçais, pois, meus amigos, que o Espiritismo é a confirmação do Cristianismo, porque o Cristianismo entra completamente nestas palavras: Amar ao Senhor sobre todas as coisas, e ao próximo como a si mesmo.
Sob o ponto de vista filosófico, é a linha de conduta reta e sábia que vos deve conduzir à felicidade que todos ambicionais; e esta linha vos é traçada partindo de um ponto seguro, demonstrado: a imortalidade da alma, para chegar a outro ponto que ninguém pode negar: Deus!3
Com efeito, o Espiritismo é um laço fraternal, que deve conduzir à prática da verdadeira caridade cristã todos quantos o compreendem na sua essência, porque ele tende a fazer desaparecer os sentimentos de ódio, de inveja e de ciúme que dividem os homens.
Mas essa fraternidade não será a de uma seita; para estar em conformidade com os divinos preceitos do Cristo, deve abarcar a Humanidade inteira, pois todos os homens são filhos de Deus. Se alguns estão tresmalhados, ela ordena que os lamentemos e proíbe que os odiemos.
“Amai-vos uns aos outros”, disse Jesus. Ele não disse: “Não ameis senão aos que pensam como vós”. Eis por que, quando nossos adversários nos atiram uma pedra, não lhes devemos devolver maldições. Estes princípios converterão aqueles que os professam em homens pacíficos que não encontrarão na desordem e na prática do mal ao próximo a satisfação de suas paixões.4
Se vos atirarem pedras, nem as recolhais, nem as devolvais. Entre eles e vós, Deus será o juiz dos sentimentos de cada um. Que aqueles que se julgam os únicos certos o provem por maior caridade e maior abnegação de amor-próprio, porque a verdade não estaria ao lado dos que desconhecem o primeiro preceito da doutrina. Se estiverdes em dúvida, fazei sempre o bem.5
Se, na atualidade, compreender para crer se tornou uma necessidade para a inteligência, como beber e comer é uma necessidade para o estômago, é que Deus quer que o homem faça uso de sua inteligência: de outro modo não tê-la-ia dado.
Há pessoas que não experimentam essa necessidade, que se contentam em crer sem exame. Não as recriminamos, e longe está de nós o pensamento de perturbá-las em sua tranquilidade. O Espiritismo evidentemente, não se destina a elas: se têm tudo o de que necessitam, nada há a oferecer-Ihes. Não se obriga a comer à força àqueles que declaram não ter fome.
O Espiritismo está destinado àqueles para os quais o alimento intelectual que lhes é dado não basta, e o número destas pessoas é tão grande que o tempo não sobra para nos ocuparmos com as outras. Por que, então, se queixam quando não lhes corremos ao encalço?
O Espiritismo não procura ninguém, não se impõe a ninguém, limita-se a dizer: Aqui me tendes, eis o que sou, eis o que trago. Os que julgam ter necessidade de mim, se aproximem; os demais permaneçam onde se encontram. Não é meu propósito perturbar-lhes a consciência nem injuriá-los. A única coisa que peço é a reciprocidade.6