Não podeis ser felizes, sem mútua benevolência, e como poderá esta existir juntamente com o orgulho?
O orgulho, eis a fonte de todos os vossos males.
Dedicai-vos, pois, à tarefa de destruí-lo, se não quiserdes perpetuar as suas funestas consequências.
Um só meio tendes para isso, mas infalível: tomai a lei do Cristo por regra invariável de vossa conduta,
essa lei que haveis rejeitado ou falseado na sua interpretação.
O orgulho e a humildade (Adolfo, Bispo de Alger)
(O Evangelho Segundo o Espiritismo » Cap. VII - Bem-aventurados
os Pobres de Espírito » Instruções dos Espíritos: O Orgulho e a humildade, item 12)
Homens, por que lamentais as calamidades que vós mesmos amontoastes sobre a vossa
cabeça? Desprezastes a santa e divina moral do Cristo; não vos admireis de que a taça da iniqüidade tenha
transbordado por toda parte.
O mal-estar se torna geral. A quem se deve, senão a vós mesmos, que incessantemente
procurais aniquilar-vos uns aos outros? Não podeis ser felizes, sem mútua benevolência, e como poderá esta
existir juntamente com o orgulho? O orgulho, eis a fonte de todos os vossos males. Dedicai-vos, pois, à
tarefa de destruí-lo, se não quiserdes perpetuar as suas funestas conseqüências. Um só meio tendes para
isso, mas infalível: tomai a lei do Cristo por regra invariável de vossa conduta, essa lei que haveis
rejeitado ou falseado na sua interpretação.
Por que tendes em tão grande estima o que brilha e
encanta os vossos olhos, em lugar do que vos toca o coração? Por que o vício que se desenvolve na
opulência é o objeto da vossa reverência, enquanto só tendes um olhar de desdém para o verdadeiro mérito,
que se oculta na obscuridade? Que um rico libertino, perdido de corpo e alma, se apresente em qualquer
lugar, e todas as portas lhe são abertas, todas as honras lhe são dispensadas, enquanto dificilmente se
concede um gesto de proteção ao homem de bem que vive do seu trabalho. Quando a consideração que se dispensa
às pessoas é medida pelo peso do ouro que elas possuem, ou pelo nome que trazem, que interesse podem ter
elas em se corrigem de seu defeito?
Bem diferente seria, entretanto, se o vício dourado fosse fustigado pela opinião
pública, como o é o vício andrajoso. Mas o orgulho é indulgente para tudo quanto o agrada. Século de
concupiscência e de dinheiro, dizeis vós. Sem dúvida; mas por que deixastes as
necessidades materiais se sobreporem ao bom-senso e à razão? Por que cada qual deseja se elevar sobre o
seu irmão? Agora, a sociedade sofre as consequências.
Não esqueçais que um tal estado de coisa é sempre o sinal da decadência moral. Quando
o orgulho atinge o seu extremo, é indício de uma próxima queda, pois Deus pune sempre os soberbos. Se às
vezes os deixa subir, é para lhes dar tempo de refletir e de emendar-se, sob os golpes que, de tempos a
tempos, desfere no seu orgulho como advertência. Entretanto, em vez de se humilharem, eles se revoltam.
Então, quando a medida está cheia. Ele a vira de repente, e a queda é tanto mais terrível, quanto mais alto
tiverem se elevado.
Pobre raça humana, cujos caminhos foram todos corrompidos pelo egoísmo, reanimai-te,
apesar disso! Na sua infinita misericórdia, Deus envia um poderoso remédio aos teus males, um socorro
inesperado à tua aflição. Abre os olhos à luz: eis que as almas dos que se foram estão de volta, para te
recordar os verdadeiros deveres. Elas te dirão, com a autoridade da experiência, quanto às vaidades e as
grandezas da vossa passageira existência são pequeninas, diante da eternidade. Dirão deste mundo; que nesta,
será maior o que foi menor entre os pequenos deste mundo; que o que mais amou os seus irmãos será o mais
amado no céu; que os poderosos da Terra, se abusaram da autoridade, serão obrigados a obedecer aos seus
servos; que a caridade e a humildade, enfim, essas duas irmãs que se dão às mãos, são os títulos mais
eficazes para obter-se a graça diante do Eterno.
O orgulho e a humildade (Lacordaire)
(O Evangelho Segundo o Espiritismo » Cap. VII - Bem-aventurados
os Pobres de Espírito » Instruções dos Espíritos: O Orgulho e a humildade, item 11)
Que a paz do senhor esteja convosco, meus queridos amigos! Venho até vós para
encorajar-vos a seguir o bom caminho.
Aos pobres de Espíritos que outrora viveram na Terra, Deus concede a missão de vir
esclarecer-vos. Bendito seja pela graça que nos dá, de podermos ajudar o vosso adiantamento. Que o Espírito
Santo me ilumine, me ajude a tornar compreensível a minha palavra, e me conceda a graça de pô-la ao alcance
de todos. Todos vós, encarnados, que estais sob a pena e procurais a luz, que à vontade de Deus venha em
minha ajuda, para fazê-la brilhar aos vossos olhos!
A humildade é uma virtude bem esquecida, entre vós. Os grandes exemplos que vos foram
dados são tão poucos seguidos. E, no entanto, sem humildade, podeis ser caridosos para o vosso próximo? Oh!,
não, porque esse sentimento nivela os homens, mostra-lhes que são irmãos, que devem ajudar-se mutuamente, e
os encaminha ao bem. Sem a humildade, enfeitai-vos de virtudes que não possuis, como se vestísseis um hábito
para ocultar as deformidades do corpo. Lembrai-vos daquele que nos salva; lembrai-vos da sua humildade, que
o fez tão grande e o elevou acima de todos os profetas.
O orgulho é o terrível adversário da humildade. Se o
Cristo prometeu o Reino dos Céus aos mais pobres, foi porque os grandes da Terra imaginavam que os títulos
e as riquezas eram a recompensa de seus méritos, e que a sua essência era mais pura que a do pobre.
Acreditavam que essas coisas lhes eram devidas, e por isso, quando Deus as retira, acusam-no de injustiça.
Oh, irrisão e cegueira! Deus, acaso, estabeleceu entre vós alguma distinção pelos corpos? O invólucro do
pobre não é o mesmo do rico? O Criador fez duas espécies de homens? Tudo quanto Deus fez é grande e sábio.
Não lhe atribuais as idéias concebidas por vossos cérebros orgulhosos.
Oh!, rico! Enquanto dormes em teus aposentos suntuosos, ao abrigo do frio, não sabes
quantos milhares de irmãos, iguais a ti, jazem na miséria? O desgraçado faminto não é teu igual? Bem sei que
o teu orgulho se revolta com estas palavras. Concordarás em lhe dar uma esmola; nunca, porém, em lhe apertar
fraternalmente a mão. Que! exclamarás: Eu, nascido de sangue nobre, um dos grandes da Terra, ser igual a
esse miserável estropiado? Vã utopia de pretensos filósofos! Se fôssemos iguais, porque Deus o teria
colocado tão baixo e a mim tão alto? É verdade que vossas roupas não são nada iguais, mas, se vos despirdes
a ambos, qual a diferença que então haverá entre vós? A nobreza do sangue, dirás. Mas a química não
encontrou diferenças entre o sangue do nobre e do plebeu, entre o do senhor e o do escravo. Quem te diz que
também não foste miserável como ele? Que não pediste esmolas? Que não a pedirás um dia a esse mesmo que hoje
desprezas? As riquezas são por acaso eternas? Não acabam com o corpo, invólucro perecível do Espírito? Oh,
debruça-te humildemente sobre ti mesmo! Lança enfim os olhos sobre a realidade
das coisas desse mundo, sobre o que constitui a grandeza e a humilhação no outro; pensa que a morte não te
poupará mais do que aos outros; que os teus títulos não te preservarão dela; que te pode ferir amanhã,
hoje, dentro de uma hora; e se ainda te sepultas no teu orgulho, oh! Então, eu te lamento, porque serás
digno de piedade!
Orgulhosos! Que fostes, antes de serdes nobres e poderosos? Talvez mais humildes que o
último de vossos servos. Curvai, portanto, vossas frontes altivas, que Deus as pode rebaixar, no momento
mesmo em que as elevais mais alto. Todos os homens são iguais na balança divina; somente as virtudes os
distinguem aos olhos de Deus. Todos os Espíritos são da mesma essência, e todos os corpos foram feitos da
mesma massa. Vossos títulos e vossos nomes em nada a modificam; ficam no túmulo; não são eles que dão a
felicidade prometida aos eleitos; a caridade e a humildade são os seus títulos de nobreza.
"...Oh, só então compreendi a fatuidade dos homens e das grandezas que tão avidamente buscamos sobre a
Terra!" (Uma rainha de França)
Pobre criatura! És mãe, e teus filhos sofrem. Estão com frio. Têm fome. Vais, curvada
ao peso da tua cruz, humilhar-te para conseguir um pedaço de pão. Oh, eu me inclino diante de ti! Como és
nobre, santa e grande aos meus olhos! Espera e ora: a felicidade ainda não é deste mundo. Aos pobres
oprimidos, que nele confiam, Deus concede o Reino dos Céus.
E tu, que és moça, pobre filha devotada ao trabalho, entregue às privações, por que
esses tristes pensamentos? Por que chorar? Que teus olhos se voltem, piedosos e serenos, para Deus: às aves
do céu ele dá o alimento. Confia nele, que não te abandonará. O ruído das festas, dos prazeres mundanos, te
faz bater o coração. Querias também enfeitar de flores a fronte e misturar-te aos felizes da Terra, dizes
que poderias, como as mulheres que vês passar, estouvadas e alegres, ser rica também. Oh, cala-te, filha!
Se soubesses quantas lágrimas e dores sem conta se ocultam sob esses vestidos
bordados, quantos suspiros se asfixiam sob o ruído dessa orquestra feliz, preferirias teu humilde retiro e
tua pobreza. Conserva-te pura aos olhos de Deus, se não queres que o teu anjo da guarda volte para
Ele, escondendo o rosto sob as asas brancas, e te deixe com os teus remorsos, sem guia, sem apoio, neste
mundo em que estarias perdida, esperando a punição no outro. E todos vós que sofreis as injustiças dos
homens, sede indulgentes para as faltas dos vossos irmãos, lembrando que vós mesmos não estais sem manchas:
isso é caridade, mas é também humildade. Se suportais calúnias, curvai a fronte diante da prova. Que vos
importam as calúnias do mundo? Se vossa conduta é pura, Deus não pode vos recompensar? Suportar
corajosamente as humilhações dos homens, é ser humilde e reconhecer que só Deus é grande e todo-poderoso.
Oh!, meu Deus, será preciso que o Cristo volte novamente a Terra, para ensinar
aos homens as tuas leis, que eles esquecem? Deverá ele ainda expulsar os vendilhões do templo, que maculam
tua casa, esse recinto de orações? E, quem sabe?, oh, homens, se Deus vos concedesse essa graça, se não o
renegaríeis de novo, como outrora? Se não o acusaríeis de blasfemo, por vir abater o orgulho dos fariseus
modernos? Talvez, mesmo, se não o faríeis seguir de novo o caminho do Gólgota?
Quando Moisés subiu ao Monte Sinai, para receber os mandamentos da Lei de Deus, o povo
de Israel, entregue a si mesmo, abandonou o verdadeiro Deus. Homens e mulheres entregaram seu ouro, para a
fabricação de um ídolo que abandonaram. Homens civilizados fazeis, entretanto, como eles. O Cristo vos
deixou a sua doutrina, vos deu o exemplo de todas as virtudes, mas abandonastes exemplos e preceitos. Cada
um de vós, carregando as suas paixões, fabricou um deus de acordo com a sua vontade: para uns terrível e
sanguinário; para outros, indiferente aos interesses do mundo. O deus que fizestes é ainda o bezerro de
ouro, que cada qual apropria aos seus gostos e às suas ideias.
Despertai, meus irmãos, meus amigos! Que a voz dos Espíritos vos toque o coração.
Sede generosos e caridosos, sem ostentação. Quer dizer: fazei o bem com
humildade. Que cada um vá demolindo aos poucos os altares elevados ao orgulho. Numa palavra: sede
verdadeiros cristãos, e atingireis o reino da verdade. Não duvideis mais da bondade de Deus, agora
que Ele vos envia tantas provas. Viemos preparar o caminho para o cumprimento das profecias. Quando o Senhor
vos der uma manifestação mais esplendente da sua clemência, que o enviado celeste vos encontre reunidos numa
grande família; que os vossos corações, brandos e humildes, sejam dignos de receber a palavra divina que Ele
vos trará; que o eleito não encontre em seu caminho senão as palmas dispostas pelo vosso retorno ao bem, à
caridade, à fraternidade; e então o vosso mundo se tornará um paraíso terreno. Mas se permanecerdes
insensíveis à voz dos Espíritos, enviados para purificar e renovar as vossas sociedades civilizadas, ricas
em conhecimentos e não obstante tão pobre de bons sentimentos, ah! nada mais nos restarás do que chorar e
gemer pela vossa sorte. Mas, não, assim não acontecerá. Voltai-vos para Deus, vosso pai, e então nós todos,
que trabalhamos para o cumprimento da sua vontade, entoaremos o cântico de agradecimento ao Senhor, por sua
inesgotável bondade, e para o glorificar por todos os séculos. Assim seja.
Advertências dos Espíritos sobre o Orgulho
(O Livro dos Espíritos & O Evangelho Segundo o
Espiritismo)
"Nossa missão é a de despertar os olhos e os ouvidos, para confundir os orgulhosos e
desmascarar os hipócritas: os que afetam exteriormente a virtude e a religião para ocultar as suas
torpezas." 1
"Lembra-te de que os Bons Espíritos só assistem aos que servem a Deus com humildade e
desinteresse e repudiam a qualquer que procure, no caminho do céu, um degrau para as coisas da Terra." 2
"A fonte do mal está no egoísmo e no orgulho. Os abusos de toda
espécie cessarão por si mesmos, quando os homens se dirigirem pela lei de caridade." 3
"Jesus dirigia-se sobretudo aos pobres e aos deserdados, porque são eles os que mais necessitam de consolação; e aos cegos humildes e de boa fé, porque pedem que lhes dê a vista, e não os orgulhosos porque eles creem possuir toda a luz e não precisar de nada." 4
Os Bons Espíritos se afastam dos orgulhosos e dos ambiciosos. O orgulho e a ambição serão
sempre uma barreira entre o homem e Deus; são um véu lançado sobre as claridades celestes e Deus
não pode servir-se do cego para fazer que compreendamos a luz."
(Prolegômenos. O Livro dos Espíritos)
"Todo aquele que revela um átomo de orgulho, fugi dele como de uma lepra contagiosa, que corrompe tudo o que toca. Lembrai-vos de que cada criatura traz na fronte, mas sobretudo nos atos, a marca de sua grandeza ou de sua decadência." 5
"Fazendo o bem e colocando toda a vossa confiança em Deus, repelis a influência dos
Espíritos inferiores e destruís o império que desejam ter sobre vós. Guardai-vos de escutar as sugestões dos
Espíritos que suscitam em vós os maus pensamentos, que insuflam a discórdia e excitam em vós todas as más
paixões. Desconfiai sobretudo dos que exaltam o vosso orgulho, porque eles
atacam na vossa fraqueza. Eis porque Jesus voz faz dizer na oração dominical: “Senhor, não nos
deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do mal!”" 6
"O orgulho vos leva a vos julgardes mais do que sois, a não aceitar
uma comparação que vos possa rebaixar, e a vos considerardes, ao contrário, de tal maneira acima de vossos
irmãos, seja na finura de espírito, seja no tocante à posição social, seja ainda em relação às vantagens
pessoais, que o menor paralelo vos irrita e vos fere. E o que acontece, então? Entregai-vos à cólera.
Procurai a origem desses acessos de demência passageira, que vos assemelham aos
brutos, fazendo-vos perder o sangue frio e a razão: procurai-a, e encontrareis quase sempre por base o
orgulho ferido. Não é acaso o orgulho ferido por uma contradita, que vos faz repelir as observações justas e
rejeitar, encolerizados, os mais sábios conselhos? Até mesmo a impaciência, causada pelas contrariedades, em
geral pueris, decorre da importância atribuída à personalidade, perante a qual julgais que todos devem
curvar-se."7
"Dizendo-nos para oferecer uma face quando formos batidos na outra, (Jesus) disse, por outras palavras, que não devemos retribuir o mal com o mal; que o homem deve aceitar com humildade tudo o que tende a reduzir-lhe o orgulho; que é mais glorioso para ele ser ferido que ferir; suportar pacientemente uma injustiça que cometê-la; que mais vale ser enganado que enganar, ser arruinado que arruinar os outros. Isto, ao mesmo tempo, é a condenação do duelo, que nada mais é que uma manifestação do orgulho."8
"O bem reinará na Terra quando, entre os Espíritos que a vêm habitar, os bons
superarem os maus. Então eles farão reinar o amor e a justiça, que são a fonte do bem e da felicidade. É pelo progresso moral e pela prática das leis de Deus que o homem atrairá para a
Terra os bons Espíritos e afastará os maus. Mas os maus só a deixarão quando o homem tiver banido daqui o
orgulho e o egoísmo."9
"O egoísmo é a negação da caridade. Ora, sem caridade não há tranqüilidade na vida
social, e digo mais, não há segurança. Com o egoísmo e o orgulho, que andam de mãos dadas, essa vida
será sempre uma corrida favorável ao mais esperto, uma luta de interesses, em que as mais santas
afeições são calcadas aos pés, em que nem mesmo os sagrados laços de família são respeitados."10
O Orgulho
Dissertação moral ditada por São Luís à senhorita Ermance Dufaux - (19 e 26 de
janeiro de 1858)
(Revista Espírita, maio de 1858)
I
Um homem soberbo possuía alguns hectares de boa
terra; sentia-se envaidecido pelas grandes espigas que cobriam o
seu campo e olhava com desdém o campo estéril do humilde. Este
se levantava ao cantar do galo e permanecia o dia todo curvado
sobre o solo ingrato; recolhia pacientemente os seixos e os lançava
à beira do caminho; revolvia profundamente a terra e arrancava
com dificuldade os espinheiros que a cobriam. Ora, seu suor
fecundou o campo e ele colheu o melhor trigo.
Entretanto, o joio crescia no campo do homem soberbo
e sufocava o trigo, enquanto o dono se vangloriava de sua
fecundidade, olhando com ar de piedade os esforços silenciosos do
humilde.
Em verdade vos digo que o orgulhoso é semelhante ao
joio que abafa o bom grão. Aquele dentre vós que acredita valer
mais que seu irmão e que disso se vangloria, é insensato; sábio,
porém, é o que trabalha por si mesmo, como o humilde em seu
campo, sem se envaidecer de sua obra.
II
Havia um homem rico e poderoso que desfrutava o favor do príncipe. Morava em palácios e numerosos servos esforçavam-se por adivinhar-lhe os desejos.
Um dia em que suas matilhas acuavam um cervo nas profundezas da floresta, ele avistou um pobre lenhador vergando ao peso de um feixe de lenha. Chamou-o e lhe disse:
─ Vil escravo! Por que passas pelo caminho sem te inclinares perante mim? Sou igual ao Senhor: nos conselhos minha voz decide a paz e a guerra, e os grandes do reino curvam-se em minha presença. Saiba que sou sábio entre os sábios, poderoso entre os poderosos, grande entre os grandes e minha elevação é obra de minhas mãos.
─ “Senhor! ─ respondeu o pobre homem ─ temi que minha saudação humilde vos fosse uma ofensa. Sou pobre e o único bem que possuo são os meus braços, mas não desejo vossas grandezas enganosas. Durmo o meu sono e não temo, como vós, que o prazer do senhor me faça cair em minha obscuridade.
Ora, o príncipe se cansou do orgulho do soberbo;
os grandes humilhados se reergueram sobre ele, que foi preciptado do auge do seu poder, como a folha seca que o vento varre do
alto de uma montanha; mas o humilde continuou pacificamente
seu rude trabalho, sem se preocupar com o dia seguinte.
III
Soberbo, humilha-te, porquanto a mão do Senhor
dobrará teu orgulho até que se reduza a pó!
Escuta! Nasceste onde te lançou a sorte; saíste do seio
de tua mãe, fraco e despido como o último dos homens. Por que
elevas mais alto a fronte do que os teus semelhantes, tu que, como
eles, nasceste para a dor e para a morte?
Ouve! Tuas riquezas e tuas grandezas, vaidade das
vaidades, escaparão de tuas mãos quando vier o Grande Dia, como
as águas errantes da torrente que o sol faz evaporar. De tuas riquezas só levarás contigo as tábuas do
caixão; e os títulos gravados na
lápide sepulcral serão palavras vazias de sentido.
Escuta! O cão do coveiro brincará com teus ossos, e
eles serão misturados aos dos indigentes, confundindo-se tuas cinzas
com as deles, porque um dia ambos sereis reduzidos a pó.
Amaldiçoarás, então, os dons que recebeste, quando vires o mendigo
revestido na sua glória, e chorarás o teu orgulho.
Humilha-te, soberbo, porquanto a mão do Senhor
curvará o teu orgulho até o pó.
– Por que São Luís nos fala em parábolas?
Resp. – O Espírito humano ama o mistério; a lição se
grava melhor no coração quando a procuramos.
– Não parece que atualmente a instrução nos deva ser
dada de maneira mais direta, sem que precisemos recorrer à alegoria?
Resp. – Encontrá-la-eis no desenvolvimento. Desejo ser
lido, e a moral necessita ser disfarçada sob a atração do prazer.
O egoísmo e o orgulho
Suas causas, seus efeitos e os meios de destruí-los
(Obras Póstumas » I Parte » O egoísmo e o orgulho)
É bem sabido que a maior parte das misérias da vida tem origem no egoísmo dos homens. Desde que cada um pensa em si antes de pensar nos outros e cogita antes de tudo de satisfazer aos seus desejos, cada um naturalmente cuida de proporcionar a si mesmo essa satisfação, a todo custo, e sacrifica sem escrúpulo os interesses alheios, assim nas mais insignificantes coisas, como nas maiores, tanto de ordem moral, quanto de ordem material.
Daí todos os antagonismos sociais, todas as lutas, todos os conflitos e todas as misérias, visto que cada um só trata de despojar o seu próximo.
O egoísmo, por sua vez, se origina do orgulho. A exaltação da personalidade leva o homem a considerar-se acima dos outros. Julgando-se com direitos superiores, melindra-se com o que quer que, a seu ver, constitua ofensa a seus direitos. A importância que, por orgulho, atribui à sua pessoa, naturalmente o torna egoísta.
O egoísmo e o orgulho nascem de um sentimento natural: o instinto de conservação. Todos os instintos têm sua razão de ser e sua utilidade, porquanto Deus nada pode ter feito inútil. Ele não criou o mal; o homem é quem o produz, abusando dos dons de Deus, em virtude do seu livre-arbítrio.
Contido em justos limites, aquele sentimento é bom em si mesmo. A exageração é o que o torna mau e pernicioso. O mesmo acontece com todas as paixões que o homem freqüentemente desvia do seu objetivo providencial. Ele não foi criado egoísta, nem orgulhoso por Deus, que o criou simples e ignorante; o homem é que se fez egoísta e orgulhoso, exagerando o instinto que Deus lhe outorgou para sua conservação.
“O egoísmo e o orgulho matam as sociedades particulares, como matam os povos e as sociedades em geral. Lede a história e vereis que os povos sucumbem sob o amplexo desses dois mortais inimigos da felicidade humana. Quando se apoiarem nas bases da caridade, serão indissolúveis, porque estarão em paz entre si e consigo mesmos, cada um respeitando os bens e os direitos dos vizinhos. Essa será a nova era predita, da qual o Espiritismo é o precursor, e para a qual todo espírita deve trabalhar, cada um na sua esfera de atividade. É uma tarefa que lhes incumbe, e da qual serão recompensados conforme a maneira pela qual a tenham realizado, pois Deus saberá distinguir os que no Espiritismo só procuraram a sua satisfação pessoal daqueles que ao mesmo tempo trabalharam pela felicidade de seus irmãos.”1
Para mim, um homem é um homem, isto apenas! Meço seu valor por seus atos, por seus sentimentos, nunca por sua posição social.
Pertença ele às mais altas camadas da sociedade, se age mal, se é egoísta e negligente de sua dignidade é, a meus olhos, inferior ao operário que procede corretamente, e eu aperto mais cordialmente a mão de um homem humilde, cujo coração estou a ouvir, do que a de um potentado cujo peito emudeceu. A primeira me aquece, a segunda me enregela.
Homens da mais alta posição honram-me com sua visita, porém nunca, por causa deles, um operário ficou na antecâmara.
Muitas vezes, em meu salão, o príncipe se assenta ao lado do operário; se se sentir humilhado, eu direi que ele não é digno de ser espírita. Mas sinto-me feliz em dizer, eu os vi, muitas vezes, apertarem-se as mãos, fraternalmente, e, então, um pensamento me ocorria: “Espiritismo, eis um dos teus milagres; este é o prenúncio de muitos outros prodígios!”2
Segundo a compreensão moral, essas palavras de Jesus significam o seguinte: Pedi a luz que deve clarear o vosso caminho, e ela vos será dada; pedi a força de resistir ao mal, e a tereis; pedi a assistência dos Bons Espíritos, e eles virão ajudar-vos, e como o anjo de Tobias, vos servirão de guias: pedi bons conselhos, e jamais vos serão recusados; batei à nossa porta, e ela vos será aberta; mas pedi sinceramente, com fé, fervor e confiança; apresentai-vos com humildade e não com arrogância, sem o que sereis abandonados às vossas próprias forças, e as próprias quedas que sofrerdes constituirão a punição do vosso orgulho.
É esse o sentido dessas palavras do Cristo: Buscai e achareis, batei e abrir-se-vos-á.3
Médiuns orgulhosos
(O Livro dos Médiuns » Influência moral dos médiuns nas comunicações » itens 227 e 228)
227. Se o médium, quanto à execução, é apenas um instrumento, no tocante à moral exerce grande influência. Porque o Espírito comunicante identifica-se com o Espírito do médium, e para essa identificação é necessário haver simpatia entre eles, e se assim podemos dizer, afinidade.
A alma exerce sobre o Espírito comunicante uma espécie de atração ou de repulsão, segundo o grau de semelhança ou dessemelhança entre eles. Ora, os bons têm afinidade com os bons e os maus com os maus, de onde se segue que as qualidades morais do médium têm influência capital sobre a natureza dos Espíritos que se comunicam por seu intermédio.
Se o médium é de baixa moral, os Espíritos inferiores se agrupam em torno dele e estão sempre prontos a tomar o lugar dos bons Espíritos a que ele apelou. As qualidades que atraem de preferência os Espíritos bons são: a bondade, a benevolência, a simplicidade de coração, o amor ao próximo, o desprendimento das coisas materiais. Os defeitos que os afastam são: o orgulho, o egoísmo, a inveja, o ciúme, o ódio, a cupidez, e sensualidade e todas as paixões pelas quais o homem se apega à matéria.
228. Todas as imperfeições morais são portas abertas aos Espíritos maus, mas a que eles exploram com mais habilidade é o orgulho, porque é essa a que menos a gente se confessa a si mesmo. O orgulho tem posto a perder numerosos médiuns dotados das mais belas faculdades, que, sem ele, seriam instrumentos excelentes e muito úteis.
Tornando-se presa de Espíritos mentirosos, suas faculdades foram primeiramente pervertidas, depois aniquiladas, e diversos se viram humilhados pelas mais amargas decepções.
O orgulho se manifesta, nos médiuns, por sinais inequívocos, para os quais é necessário chamar a atenção, porque é ele um dos elementos que mais devem despertar a desconfiança sobre a veracidade das suas comunicações. Começa por uma confiança cega na superioridade das comunicações recebidas e na infalibilidade do Espírito que as transmite. Disso resulta um certo desdém por tudo o que não procede deles, que julgam possuir o privilégio da verdade.
O prestígio dos grandes nomes com que se enfeitam os Espíritos que se dizem seus protetores os deslumbra. E como o seu amor próprio sofreria se tivessem de se confessar enganados, repelem toda espécie de conselhos e até mesmo os evitam, afastando-se dos amigos e de quem quer que lhes possam abrir os olhos. Se concordarem em ouvir essas pessoas, não dão nenhuma importância às suas advertências, porque duvidar da superioridade do Espírito que os guia seria quase uma profanação.
Chocam-se com a menor discordância, com a mais leve observação crítica, e chegam às vezes a odiar até mesmo as pessoas que lhes prestam serviços.
Favorecendo esse isolamento provocado pelos Espíritos que não querem ter contraditores esses mesmos Espíritos tudo fazem para os entreter nas suas ilusões, levando-os ingenuamente a considerar os maiores absurdos como coisas sublimes.
Assim: confiança absoluta na superioridade das comunicações obtidas, desprezo pelas que não vierem por seu intermédio, consideração irrefletida pelos grandes nomes, rejeição de conselhos, repulsa a qualquer crítica, afastamento dos que podem dar opiniões desinteressadas, confiança na própria habilidade apesar da falta de experiência – são essas as características dos médiuns orgulhos.
Necessário lembrar ainda que o orgulho é quase sempre excitado no médium pelos que dele se servem. Se possui faculdades um pouco além do comum, é procurado e elogiado, julgando-se indispensável e logo afetando ares de importância e desdém, quando presta o seu concurso. Já tivemos de lamentar, várias vezes, os elogios feitos a alguns médiuns, com a intenção de encorajá-los.
Para impor-se ao médium, os maus Espíritos sabem explorar habilmente todas as suas fraquezas, e, entre os nossos defeitos, o que lhes dá margem maior é o orgulho, sentimento que se encontra mais dominante na maioria dos médiuns obsidiados e, principalmente, nos fascinados. É o orgulho que faz se julguem infalíveis e repilam todos os conselhos. Esse sentimento é infelizmente excitado pelos elogios de que são objeto; basta que um médium apresente faculdade um pouco transcendente, para que o busquem, o adulem, dando lugar a que ele exagere sua importância e se julgue como indispensável, o que vem a perdê-lo.1