I – Conclusão – O Livro dos Espíritos

Aquele que só conhecesse de magnetismo terrestre o jogo dos patinhos imantados, que fazemos nadar na água de uma bacia, dificilmente poderia compreender que esse brinquedo encerra o segredo do mecanismo do Universo e do movimento dos mundos. Acontece o mesmo com o que só conhece do Espiritismo o movimento das mesas; ele não vê mais que um divertimento, um passatempo das reuniões sociais e não compreende que esse fenômeno tão simples e tão vulgar, conhecido da Antiguidade e até mesmo dos povos semisselvagens, possa estar ligado aos mais graves problemas da ordem social*. Para o observador superficial, com efeito que relação pode ter uma mesa que gira com a moral e o futuro da Humanidade? Mas quem quiser refletir se lembrará de que de uma simples panela cuja tampa se erguia com o vapor, fato que também se verificava desde toda a Antiguidade, saiu o possante motor com que o homem atravessa o espaço suprimindo as distâncias. Pois bem: vós que não acreditais em nada fora do mundo material sabei que dessa mesa que gira e provoca o vosso sorriso de desdém saiu toda uma Ciência, com a solução de problemas que nenhuma filosofia pudera resolver. Apelo a todos os adversários de boa-fé e lhes suplico dizerem se tiverem o trabalho de estudar o que criticam. Porque em boa lógica a crítica só tem valor quando o crítico conhece o assunto. Zombar de uma coisa que não se conhece, que não se sondou com o escalpelo do observador consciencioso não é criticar mas dar prova de leviandade e uma pobre ideia de sua capacidade de julgamento. Seguramente, se tivéssemos apresentado esta filosofia como sendo uma obra do cérebro humano ela teria encontrado menos desdém e teria merecido as honras de um exame dos que pretendem dirigir a opinião. Mas ela vem dos Espíritos, que absurdo! É muito que mereça um olhar. Julgam-na pelo título, como o macaco da fábula julgava a noz pela casca. Fazei, se o quiserdes, abstração da origem; suponde que este livro seja obra de um homem e dizei no vosso íntimo e em consciência, depois de o ler seriamente, se encontrastes matéria para zombaria.

NOTA:
* “Um passatempo das reuniões sociais”, ou “un passe-temps de societé”, porque, nos dias de Kardec estava muito em moda na sociedade europeia, espalhando-se por todo o mundo como procedente da América, a prática das chamadas “sessões de mesinha”, com a “mesa-falante”. Era essa uma forma de que os Espíritos se utilizavam para realizar, segundo observa Conan Doyle, em sua “História do Espiritismo”, uma verdadeira invasão do mundo pelas suas manifestações. (N. do T.)

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